Logistica em situação de crise /Vanessa Ribeiro da Cruz

29/09/2015 17:35

LOGÍSTICA EM SITUAÇÕES DE CRISE – PARTE 1

 

Dr. Alexandre Rodrigues, Ph.D.

Em termos gerais, três objetivos estratégicos necessitam ser avaliados e equilibrados para a maximização do desempenho de uma cadeia de suprimento operando em um ambiente empresarial: redução de custos operacionais, redução de investimento em capital e melhoria no nível de serviço.

O objetivo de redução de custos está direcionado à minimização de custos associados primariamente às atividades de transporte, movimentação e armazenagem.

A redução de capital foca na diminuição de investimentos nos recursos utilizados nas atividades logísticas, maximizando, desta forma, o retorno sobre ativos. O objetivo estratégico de melhoria do nível de serviço busca a maximização do valor provido ao cliente, associado à potencial maximização de receitas e à consequente sustentabilidade do negócio no longo prazo.

Desse modo, o objetivo estratégico de uma cadeia de suprimento empresarial pode ser definido com base nos retornos financeiros providos aos acionistas e ao valor entregue ao cliente, ou seja, pela produção de lucro e produtos e/ou serviços de alta qualidade, alinhados aos objetivos e valores percebidos pelos clientes.

Numa situação de crise, no entanto, os objetivos são particularmente diferentes. Cadeias de suprimento que operam em uma conjuntura emergencial possuem uma urgente prioridade na maximização do nível de serviço num ambiente no qual pressões para uma precisa acomodação no tempo estão presentes.

Em situações de crise, o objetivo primário é a eficácia das operações. Especificamente, isso se traduz nas necessidades de rápida movimentação e entrega de alimentos, água, abrigos, vacinas, redução do sofrimento humano, tratamento médico; na criação de estruturas temporárias para transporte, armazenagem e informação; no desenvolvimento de campanhas públicas, etc.

Outra diferenciação com relação a cadeias de suprimento tradicionais é a necessidade de executar operações num ambiente de extremas restrições de recursos, capital e infraestrutura. Geralmente, em situações de crise, a infraestrutura encontra-se destruída (ou no mínimo amplamente danificada), resultando em dificuldades de transporte, comunicação, abrigo, condições alimentares e sanitárias básicas, tornando a realização das atividades logísticas um desafio.

Iniciada em 2009, essa linha de pesquisa vem sendo desenvolvida no Instituto de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppead-UFRJ), com o intuito de unificar os referenciais teóricos e práticos presentes em diferentes áreas do conhecimento: da logística humanitária e de resposta a desastres/crises, da logística militar e da logística empresarial.

No âmbito comercial, o interesse encontra-se nas situações onde pressões no tempo estão presentes. Uma colaboração de pesquisa mais próxima entre essas áreas do conhecimento pode facilitar a estruturação de cadeias mais eficazes para lidar com as complexidades logísticas no contexto atual, tanto no setor privado quanto em situações de emergência.

O objetivo deste artigo é apresentar resultados preliminares dessa linha de pesquisa. Nesse contexto, o presente estudo busca propor um referencial teórico que auxilie as organizações de assistência e resposta a situações de crise a alcançarem melhor desempenho. Para isso, o referencial teórico proposto destaca as capacitações necessárias em cada etapa, bem como medidas de desempenho associadas.

Em termos de validade conceitual, além do esforço acadêmico de extensa revisão da literatura, este referencial foi desenvolvido com o auxílio crítico de profissionais da área militar (mediante contatos com oficiais da Escola de Guerra Naval – EGN), da área empresarial (por meio de palestras em conferências especializadas – como o Fórum Anual do ILOS) e de profissionais diretamente envolvidos na antecipação e resposta a situações de crise (através de contatos com os órgãos administrativos presentes no Centro de Operações do Rio de Janeiro – CoR).

O artigo está dividido em duas partes. Nesta primeira parte, serão apresentadas a motivação e a relevância para o desenvolvimento deste projeto de pesquisa, bem como a visão geral do referencial proposto em suas três fases (Preparação, Resposta Imediata e Reconstrução). A segunda parte do artigo detalhará o referencial proposto, apresentando os processos envolvidos e uma discussão sobre mensuração do desempenho.

MOTIVAÇÃO E RELEVÂNCIA

Dois fatores motivadores para o desenvolvimento desta linha de pesquisa, além da direta melhoria dos sistemas de resposta em situação de crise, são o aumento recente no número de desastres naturais e o fato de que as cadeias de suprimento comerciais também são afetadas quando estas catástrofes ocorrem.

Nos últimos anos, o mundo observou um aumento no número de desastres reportados. Esses constituem um padrão de elevação de volatilidade e são comumente atribuídos a mudanças climáticas e de padrões de ocupação humana em locais perigosos. Se anteriormente essas mudanças eram consideradas anomalias, atualmente são constantes e com tendência a crescimento.

O Cred (Centre for Research on the Epidemiology of Disasters), centro de pesquisa colaborador com a WHO (World Health Organization) e a UCL (Université Catholique de Louvain), na Bélgica, mantém um abrangente banco de dados com o objetivo de prestar apoio a ações humanitárias internacionais. A iniciativa procura racionalizar a tomada de decisões em preparação à catástrofe, bem como prover avaliações de vulnerabilidade e priorização de necessidades. O EM-DAT (Emergency Events Database) contém dados essenciais sobre a ocorrência e os efeitos de mais de 18 mil desastres no mundo desde 1900 até a presente data. O banco de dados é construído por intermédio de diversas fontes, incluindo agências das Nações Unidas, organizações não governamentais, empresas seguradoras, institutos de pesquisa e agências de jornalismo. Nos últimos 50 anos, o número de desastres reportados cresceu mais de 1.000% (Figura 1).

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